Como desenvolver jogadores criativos?

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A criatividade é uma palavra recorrente no futebol e muitas vezes está relacionada ao ataque, com jogadas plásticas e gols bonitos. Jogadores criativos embelezam o esporte. Mas afinal, existe uma maneira de desenvolver jogadores criativos? Essa pergunta nos leva a outro questionamento: a criatividade é inata ou adquirida? Primeiramente, para responder essas perguntas é preciso entender o que é criatividade.

O que é criatividade?

Pode-se compreender a criatividade como a capacidade de gerar respostas inesperadas para uma situação-problema. Assim, jogadores criativos são aqueles que conseguem ter uma tomada de decisão surpreendente e efetiva. Mas como tomar decisões mais efetivas no campo de jogo?

Uma tomada de decisão efetiva parte de alguns pontos básicos: analisar a situação, decidir uma ação e executá-la. Em outras palavras, mais precisamente nas palavras do treinador Jorge Jesus:

“A primeira qualidade do jogador é saber pensar o jogo. A segunda é saber decidir. E, só na terceira, vem a execução. Se não faz bem a primeira e a segunda, não é Jesus que vai te fazer executar. Primeiro tem que pensar o jogo, entender o jogo. Depois tem que saber decidir em quem passar. E depois é que vem a execução”.

A boa tomada de decisão refere-se à escolha de uma ação técnica/tática que seja benéfica para o time. De modo similar ao que falou Jorge Jesus, Vanderlei Luxemburgo criou polêmica ao dizer: “Eu não posso entrar em campo e decidir por eles”, referindo-se aos jogadores. Ambas as falas revelam a autonomia que jogadores tem em campo para tomar determinadas decisões.

A criatividade na tomada de decisão

Conforme dito anteriormente, a criatividade refere-se à capacidade de resolução de problemas através de respostas inesperadas. No futebol é comum que gestos técnicos como o drible, passes que “quebram” linhas, fintas que confundam a marcação e finalizações acrobáticas sejam consideradas ações criativas. Nesse sentido, existe uma tendência em classificar mais ações ofensivas do que defensivas como criativas.

Relacionando a tomada de decisão e a criatividade, podemos compreender que, para tomar uma decisão criativa, é necessário pensar de maneira divergente. Durante todo o tempo de jogo, inúmeras situações forçam os jogadores a decidirem sobre várias opções disponíveis. Ou seja, existem milhares de oportunidades de tomar uma decisão criativa dentro de uma partida. Porém, como treinar para tomar uma decisão inesperada?

Como desenvolver jogadores criativos?

A criatividade, para muitos, é algo inato. Entretanto, a literatura sobre o tema revela que a criatividade pode ser, sim, desenvolvida. Segundo o conceito trazido neste texto, a criatividade é uma ação que busca respostas incomuns. Em outras palavras, um atleta pode aprender a avaliar rapidamente as circunstâncias e tomar uma decisão menos óbvia. Quanto mais conhecimento de jogo (processual, pelo menos) e velocidade de raciocínio o jogador possuir, mais opções de ação ele terá.

Outro aspecto importante que devemos considerar é a capacidade de percepção do jogador. Durante a partida, inúmeros estímulos estão presentes disputando a atenção do atleta, por exemplo: a bola, os jogadores do próprio time, os adversários, as vozes do técnico e assim por diante. Diante desses estímulos o jogador pode estar com o foco de atenção amplo ou estreito, observando muitos ou poucos indicadores em simultâneo. Então, não basta ter conhecimento de jogo e rapidez na decisão se não houver uma seleção adequada dos estímulos importantes naquele momento.

Desenvolvendo o conhecimento de jogo

Para desenvolver a velocidade na tomada de decisão são necessários treinamentos com algumas especificidades, bem como que, para desenvolver o conhecimento de jogo é necessário treinamento. A diferença, todavia, é na forma de condução dos treinamentos. Alguns treinadores comandam treinos onde eles apenas ordenam os jogadores a executar ações ou cumprir objetivos. Faltando, assim, explicação aos jogadores sobre o treinamento e suas funções.

De maneira análoga, existem treinadores que explicam demais o treino. Como resultado, em ambas situações mencionadas, os atletas deixam de pensar o jogo por conta própria. Outro problema comum são os treinadores que “narram” o jogo, dizendo as ações que cada jogador com a bola tem que fazer. Isso condiciona os jogadores a serem meros repetidores.

Diante disso, pode-se compreender que, para terem expertise (especialidade) no futebol, os jogadores têm de ser ensinados a avaliar o contexto e escolher suas ações. Isso, por sua vez, se dá através do ensino tático, ressaltando a importância de uma boa tomada de decisão. Entretanto, a decisão criativa nem sempre condiz com as ideias do modelo de jogo. Em alguns momentos os atletas esperam que a jogada tenha um desfecho, porém o jogador criativo faz algo diferente. Por isso é preciso aprender a pensar o jogo, ratificando as palavras de Jorge Jesus.

O treinador e os jogadores criativos

Durante os treinamentos é essencial que o treinador explique algumas funções da atividade, bem como os objetivos, porém deixe algumas informações em aberto. Desse modo, os jogadores terão de pensar em como agir para chegar ao objetivo, desenvolvendo estratégias e exercitando o pensamento crítico. Algo similar ao que o treinador José Mourinho desenvolveu e pode ser melhor compreendido no livro “Mourinho: a descoberta guiada”.

Em conclusão, podemos indicar que o desenvolvimento da criatividade passa por uma ampliação da expertise do jogador, fornecendo-lhe maior capacidade de resposta aos problemas de jogo. Ou seja, quanto maior capacidade de resposta, menos obvio será seu comportamento e mais criativa poderá ser sua ação em campo.

Confira abaixo um episódio em nosso Podcast sobre o assunto:

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Instagram: @28padilha
E-mail: matheuspadilhaar@gmail.com

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João Bonfatti

João Bonfatti atualmente trabalha como Coordenador do setor de Análise de Desempenho no América-MG. Antes disso, teve passagens pelo Vasco da Gama, onde atuou em diferentes categorias: foi auxiliar técnico do Sub-20, treinador interino do Sub-17 e auxiliar técnico do Sub-17.

Atuou também pelo Atlético-MG, onde desempenhou o papel de auxiliar técnico do Sub-15. No Corinthians, auxiliar técnico do Sub-14, além de exercer a função de supervisor metodológico.

Sua formação inclui o Bacharelado em Futebol pela Universidade Federal de Viçosa e a Licença B da CBF Academy, o que reforça sua base teórica e prática no desenvolvimento de atletas.

Felipe Bonholi

Felipe Bonholi integra a equipe do Palmeiras como Analista de Desempenho no Centro de Formação de Atletas (CFA), contribuindo para o desenvolvimento e acompanhamento de jovens talentos.

Antes disso, acumulou cinco anos de experiência na Ferroviária, onde atuou como Analista de Desempenho da equipe profissional, e no São Carlos Futebol Clube na mesma função.

Sua formação acadêmica inclui Bacharelado em Administração de Empresas pela UNIARA (2014–2017) e graduação em andamento em Educação Física pela mesma instituição, iniciada em 2019.

Com sólida base teórica e ampla experiência prática, Felipe Bonholi se destaca por sua capacidade de integrar análise técnica, gestão e visão estratégica no contexto esportivo, contribuindo para o desempenho e evolução de atletas e equipes.

Mylena Baransk

Mylena Baransk é doutora em Educação Física pela Universidade Federal do Paraná e mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, onde também concluiu sua graduação em Educação Física – Bacharelado. Especialista em futsal com foco em análise de desempenho, atuou como docente em cursos do ensino superior e analista de desempenho no futebol.

Atualmente, exerce a função de analista de desempenho no Clube Atlético Mineiro, onde trabalha desde agosto de 2024. Antes disso, desempenhou a mesma função na Associação Ferroviária de Esportes entre março e agosto de 2024, atuando em Araraquara, São Paulo.

Além da atuação em clubes, possui experiência acadêmica como docente, tendo lecionado na UniCesumar entre julho e outubro de 2023, em Curitiba, Paraná. Também foi professora na UNIFATEB, onde atuou por quase três anos, de fevereiro de 2021 a outubro de 2023, em Telêmaco Borba, Paraná.

Com forte presença na área de análise de desempenho no futebol, também é CEO da Statisticsfut, onde se dedica ao desenvolvimento de conteúdos e estratégias voltadas à análise estatística e desempenho esportivo.

Nathália Arnosti

Nathália Arnosti é uma profissional de destaque na área de Fisiologia do Esporte e Preparação Física, com sólida formação acadêmica e ampla experiência no futebol brasileiro.

Bacharel e mestre em Educação Física pela Universidade Metodista de Piracicaba e doutora pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ela construiu uma carreira marcada pela integração entre ciência e prática esportiva.

No cenário dos clubes, já contribuiu com equipes como Athletico Paranaense, Red Bull Bragantino, Palmeiras, Audax, Ferroviária e Ponte Preta. Em janeiro de 2024, assumiu o cargo de fisiologista do Cruzeiro, reforçando seu papel como referência no acompanhamento e otimização do desempenho esportivo.

Rodrigo Aquino

Rodrigo Aquino é professor na Universidade Federal do Espírito Santo, onde atua no Departamento de Desportos e como docente do Programa de Pós-Graduação em Educação Física (Mestrado e Doutorado).

É líder do Grupo de Estudos Pesquisa em Ciências no Futebol (GECIF/UFES) e coordenador do Programa Academia e Futebol (Núcleo UFES), financiado pelo Ministério do Esporte. Seu trabalho envolve a coordenação de projetos técnico-científicos em parceria com categorias de base e equipes profissionais de futebol no Brasil.

Rodrigo é graduado em Educação Física e Esporte pela USP, com especialização em Ciências do Desporto pela Universidade do Porto. Concluiu o mestrado e doutorado em Ciências também pela USP. Acumula experiência prática no futebol desde 2015 como fisiologista e preparador físico em clubes profissionais, além de atuar como treinador e coordenador técnico em categorias de base. Reconhecido academicamente, está entre os 10 cientistas do esporte mais produtivos da América Latina em publicações científicas relacionadas ao futebol.

Neto Pereira

Neto Pereira é um profissional de preparação física e performance esportiva com experiência em clubes do Brasil e do exterior. Atualmente é Preparador Físico no sub-20 do Vasco da Gama.

Trabalhou como Head Performance and Fitness Coach no FC Semey do Cazaquistão (2024). Foi Preparador Físico no Confiança (2023-2024) e Head of Performance and Health no Avaí (2022-2023). Também exerceu o cargo de Coordenador de Performance no Confiança (2022) e trabalhou como Fisiologista no CRB (2021-2022) e no próprio Confiança (2019-2021).

Possui Mestrado em Saúde e Educação Física pela Universidade Federal de Sergipe e Especialização em Desempenho Humano pela Universidade Tiradentes (Unit). Suas principais competências incluem preparação física, análise de desempenho, força, potência e velocidade no esporte.

Rafael Grazioli

Rafael Grazioli, natural de Canoas (RS), é formado em Educação Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde também concluiu mestrado e doutorado em Ciências do Movimento Humano.

Com nove anos de experiência atuando como coordenador científico e fisiologista no futebol profissional, ele passou as últimas três temporadas no Guarani de Campinas (SP) antes de ser anunciado pelo Criciúma em janeiro de 2025.